quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A poltrona de Buda



Estou sentado no sítio mais aborrecido do mundo.

E vejo o futuro.

Cheio de nuvens cinzentas e gente com muita, muita caspa.

Os carros passam em fila, tão devagar que conseguimos ver o fumo rodopiar à saída do escape. Sentados nos bancos altos das bancas de comida, vegetam fumadores de cachimbos de água com o olhar fixo nos anúncios tridimensionais que cintilam e flutuam no topo dos arranha-céus.

Se o futuro é assim Deckard, desta poltrona te digo, desta poltrona onde, reza a história, o Buda Urbano se sentou a descansar após anos de meditação, desta poltrona no octogésimo nono andar do edifício onde trabalham os homens mais poderosos e aborrecidos da Terra. Desta poltrona do Buda dos nossos tempos, o Buda corporativo de fato impecável e gravata de seda, com a poltrona virada para uma janela imensa de onde se vê a cidade, te digo: o tédio reinará sobre os povos e todos se sentirão muito, muito cansados. E desta civilização repleta de molengões, não nascerá nada de novo. Tudo ficará para sempre na mesma, eternizando-se a preguiça, o dolce fare niente. E não haverá replicante ou extraterrestre que nos arranque desta rendição indolente.