domingo, 31 de outubro de 2004

Tormenta

Deixei os sorvetes trocados por dinares em cima de um cemitério índio algures, longe das tíbias e dos perónios.

Soletrei tabuletas que indicavam restaurantes fechados e ventos cruzados que nos secavam a boca e dinamitavam os olhos.

Vi, de revés, uma folha seca de papel timbrado com um memorando sobre a tristeza.

Chorei o que tinha a chorar à sombra de um cacto apodrecido e continuei a sujar os sapatos na poeira fina do caminho.

Tive saudades dos girassois e das massarocas, das danças regionais em trajes coloridos. Senti muito a falta de um cachecol às riscas.

Aqui, o tempo não passa. Nunca esteve por estes lados.

Aqui, nunca ninguém esteve atrasado ou perdeu um comboio ou uma camioneta.

Aqui, podemos sentar-nos e cantarolar uma canção sem parar durante dias.

Uma canção que diz:


Não temos tempo
Não temos tempo
O nosso tempo fugiu
Faz muito, muito tempo

Não temos tempo
Não temos tempo
O nosso tempo fugiu
Faz muito, muito tempo

Não temos tempo
Não temos tempo
O nosso tempo fugiu
Faz muito, muito tempo