quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Já não se podem fazer clássicos... (O Steed foi ver "O Discurso do Rei")

Sabe tão bem ouvir falar inglês correctamente. God Save the King!

"Inception" - check.
"Rede Social" - check.
"Cisne Negro" - check.
"O Discurso do Rei" - check.

E ao quarto nomeado para o Oscar de melhor filme pergunto: Já não se podem fazer clássicos? É proibido filmar de forma certinha, sem grandes inovações formais ou narrativas? Confiar apenas no talento dos actores e num argumento equilibrado e bem escrito?

É preciso inovar a toda a hora? Mexer muito a câmera, ou não a mexer de todo? Filmar a preto e branco ou com muitos filtros? Afirmar muitas vezes que se fez um "filme intimista" que "explora as profundezas e complexidades da condição humana"? Mostrar sangue e/ou pessoas em pelota? Pobrezinhos a chutar para a veia?

Não podemos simplesmente apreciar o que é simples e bem feito? O que é elegante, discreto e de bom gosto? Atrevo-me mesmo a uma tirada vista como herética em certos círculos: não podemos louvar o que é "acessível" sem que algumas pessoas deixem de nos falar?

A tentação de colar um filme inglês deste género ao vetusto chavão do "selo de qualidade da BBC" é sempre grande, demasiado fácil.

Permitam-me um aparte curioso, duas das produções britânicas para televisão de maior valor, "The Jewel in the Crown" e "Brideshead Revisited", foram exibidas na ITV. Parece que a história do tal "selo de qualidade" não é exclusiva da BBC.

"O Discurso do Rei" é uma história interessante, pode ser um fait-divers, mas caraças, a Sophie Copolla passa a vida a filmar o nada e o quotidiano da fama e a malta gosta imenso.

Com excepção do Winston Churchill do Timothy Spall (muito mauzinho, valha-nos Deus...) o elenco é excelente e resiste ao exagero e à caricatura (excepto o pobre Churchill, não me canso de o repetir, mas convenhamos que não é fácil).

Existe, apesar do óbvio tom clássico, uma leve e bem doseada série de planos e sequências que não vemos numa produção para TV e o conjunto afasta-nos do que é mais corriqueiro. Tom Hooper não permite um vestígio sequer da pompa pretensiosa omnipresente nas enormes secas made in Merchant Ivory.

Em suma, é essa a maior virtude de "O Discurso do Rei". "Apenas" o facto de ser um filme todo ele feito de forma clássica, conservadora, o que lhe queiram chamar. E ainda assim, só para chatear, é um rico filme!

Dou-lhe sete mil God Save the Kings e quatro mil setecentos e treze Rule Britannias.