quarta-feira, 2 de março de 2005

Hello Kehbab

Entrevista com Ytzahk Lansky, escritor Israelita, por ocasião do lançamento do seu último livro, “Hello Kehbab”, no nosso país.


Ytzahk Lansky, você é um escritor conceituado em Israel, com uma vastíssima obra literária traduzida em diversas línguas. Como encara toda a controvérsia que “Hello Kehbab” gerou?

Muito obrigado pelos elogios, são certamente mais do que aqueles que merecia ouvir. Muito obrigado também pelo convite que me endereçaram. Quanto ao livro, acho que as opiniões inflamadas ouvidas em Israel foram um exagero. Nada justificava aquela ânsia destrutiva que se abateu sobre a minha obra. Claro que abordo alguns temas incómodos e acho perfeitamente natural que existam sectores na sociedade do meu país que não queiram que se fale deles. Mas vendo tudo friamente foi demais.

As suas origens são algo estranhas, a sua mãe é Libanesa, o seu pai é Israelita e viajaram imenso por países Árabes.

Sim. O meu pai ganhou imenso dinheiro a construir colonatos ilegais nos territórios ocupados e por isso tínhamos posses para viajar com frequência. Como o meu pai era mais um cidadão do mundo do que um Israelita clássico, cheio de medo dos que o rodeiam, andámos por toda a parte sem problemas e divertimo-nos imenso. O meu pai fazia amigos facilmente.

E inimigos também…

Bom, o meu pai era muito brincalhão e um dia tivemos um problema na Líbia...ele disse em voz alta que o Kadhaffi era um palhaço.

E houve muita gente que ouviu?

Bem, considerando que 15 minutos antes ele se tinha posto em pé, em cima de uma caixa de madeira e dançado sapateado vestido de Marlene Dietrich, acho que sim…

O que aconteceu a seguir?

Fugimos rapidamente dali e passámos a fronteira de noite disfarçados de omoletas. Os Líbios têm um nojo terrível de omoletas - chamam-lhes “ovos chulé” - e por isso não revistaram a camioneta em que íamos. Mas tive de impedir que o meu pai continuasse a rir, não fossem os guardas desconfiar.

O seu pai era conhecido por ter um sentido de humor muito cáustico e em certas ocasiões também inconsciente…

Sim…mas porque é só me faz perguntas sobre o meu pai? Supostamente estaríamos aqui para falar do livro…

Já lá vamos, já lá vamos…estava a pôr-lhe uma questão sobre o sentido de humor do seu pai...

Está bem… o meu pai tinha na realidade um sentido de humor que, por vezes, era embaraçoso. Uma vez em Jerusalém, apertou uma bochecha ao Arafat e disse-lhe que ele estava a ficar gordinho. Felizmente, o líder palestiniano era uma pessoa bem disposta e fomos só açoitados. Aliás, só eu é que fui açoitado porque o meu pai fez uma fita, chorou baba e ranho e o Arafat mandou-o embora porque ele lhe estava a fazer dores de cabeça.

E mais?

Mais o quê?

Mais histórias do seu pai…

Não, agora temos de falar sobre o meu livro!

Vá lá, só mais uma…depois falamos só do seu livro. Tudo o que quiser.

Bom, está bem… se é assim… Há mais uma história que teve lugar em Beirute na altura da Guerra Civil.

O que é que ele fez?

Naquela época eram frequentes os raptos de estrangeiros, um pouco como está a acontecer agora no Iraque. Tínhamos ido passar duas semanas ao Líbano, de visita a uns familiares da minha mãe. O meu pai estava aborrecidíssimo, achava a família da minha mãe insuportavelmente chata e pretensiosa. Por isso decidiu encenar o seu próprio rapto. Obrigou-me a vestir de terrorista e a gravar uma mensagem dele com uma faca enorme encostada ao pescoço, com a camera de vídeo que tínhamos acabado de comprar. E depois fez chegar a cassette à Associated Press.

Isso deve ter sido como uma bomba.

Na realidade o governo Israelita pensou que era tudo real e reagiu, houve um ataque aéreo e tudo, como retaliação. Eu é que decidi acabar com a farsa e liguei ao correspondente da AP em Beirute. O meu pai ficou fulo e mandou-me açoitar por um grupo de mulheres muçulmanas.

AH AH AH AH AH AH…

Pois, você acha muita piada não é? Não foi você que foi açoitado! Já podemos falar sobre o meu livro? Já se riu o suficiente?

Huh….não. Na verdade não.

Não o quê?

Na verdade não vamos falar sobre o seu livro.

Está a brincar não?

Pois…realmente, não. Eu acho o seu livro uma porcaria. Além disso está cheio de erros.

Erros?

Sim. Por exemplo, não existe nenhum número 32 na Rue des Sables em Paris.

Mas, mas isso é um detalhe apenas…

Pois, pois, pois, pois… mas é um erro e isso faz com que o seu livro passe a ser desprezado e vilipendiado pelos media.

Vili…quê?

Adeusinho pá. Já temos o que queríamos. As histórias do teu pai. Isso sim é material do bom.

Mãããããeeeeee!!!!